quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Menos xenofobia, mais migração, mais empatia, mais educação

Xenófobos existem em todo lugar do Brasil. Talvez em São Paulo e nos estados do Sul eles existam em maior número e por isso sejam mais corajosos para se manifestar, mas infelizmente é uma falha de empatia e sociabilidade que está espalhada pelo país, pelo mundo.

Apesar de não serem maioria, os xenófobos fazem muito estrago e precisam responder por seus crimes. Mas enquanto não os cometem, temos que suportar vários deles. Existem xenófobos na minha família, entre meus vizinhos, entre meus colegas de trabalho. E apesar de todas as diferenças de idade, classe social e escolaridade, eles têm algumas características em comum:

  • saudosismo, apego ao passado, ao status quo, à forma como tudo teoricamente funcionava antes;
  • frustração por se sentirem presos a um lugar (seja por medo, tradição ou por alguma "obrigação" familiar);
  • inveja do migrante que teve coragem de se desapegar de sua terra em busca de algum sonho;
  • e o que faz de um xenófobo um xenófobo é manifestar esses sentimentos em forma de ódio pelo estrangeiro ou pelo migrante. Quem mexeu no meu queijo?

Mas enquanto o xenófobo é cheio de ódio, o migrante é apenas alguém que está buscando ou aproveitando uma oportunidade de ser feliz. Longe da terra onde nasceu? Não importa. O migrante só quer ser feliz e ele sabe que felicidade não limite, divisa nem fronteira.

O migrante é livre, desapegado e corajoso. O xenófobo é reprimido, frustrado e apegado a um ordenamento que não existe mais nem voltará a existir.

O xenófobo tem a mente enjaulada e não consegue aproveitar a riqueza cultural e motivacional trazida pelo migrante. O migrante está com a mente aberta, preparado para aproveitar o melhor que existe no novo lugar, nas novas pessoas, nas novas situações.

O xenófobo acha que já sabe de tudo e que está sempre com a razão. O migrante tem uma enorme disposição de aprender mais sobre seu novo país, seus novos vizinhos, seu novo idioma.

Os migrantes africanos e a cegueira dos xenófobos brasileiros

Em um país como o Brasil, qual é a lógica de existir aversão aos migrantes africanos? Será que as pessoas são tão analfabetas em história assim que não sabem que se existem regiões prósperas no Brasil, grande parte desse sucesso financeiro e produtivo se deve aos africanos que aqui foram escravizados?

E será que as pessoas não notam que a maioria dos empregos para os quais os africanos estão se candidatando hoje, são aqueles que nós brasileiros não queremos fazer porque temos condições de conseguir emprego melhor?

E será que as pessoas não notam que no Brasil cada vez mais jovens têm a oportunidade de estudar e se qualificar para bons empregos, de forma que precisaremos de ainda mais imigrantes para preencher determinadas vagas?

Não vou nem entrar no mérito de que quase todos nós somos descendentes de escravos porque algumas pessoas acham que pele branca e sobrenome aristocrático excluem o "risco" de ter sangue africano correndo nas veias. Sabe de nada, inocente!

A omissão das autoridades e o trabalho ilegal

Combater a xenofobia não é fingir que os imigrantes não existem. Precisamos de uma nova lei que garanta o visto de trabalho aos estrangeiros que comprovem estar aqui para isso e também de uma nova estrutura administrativa que facilite o acolhimento e a adaptação dessas pessoas.

E por mais que a situação deles pareça difícil aqui no Brasil, eles só estão aqui porque no país de origem a situação é muito pior. Logo, convencê-los a voltar não é uma opção. E mandá-los de volta a força seria uma demonstração de falta de empatia, o que não seria muito brasileiro da nossa parte.

Evitar que eles venham para o Brasil não é uma alternativa inteligente. Os Estados Unidos já tentaram e nos provaram que isso não funciona. Ao contrário: cria uma "indústria" de imigração ilegal que enriquece alguns criminosos e faz com que os imigrantes cheguem ao destino ainda mais pobres do que chegariam.

O que podemos fazer é facilitar a legalização e propiciar as condições necessárias para que eles continuem trabalhando. Se por algum motivo impedirmos o imigrante pobre de trabalhar aqui, ele vai conseguir dinheiro para sobreviver de outras formas, como também acontece com parte dos latinos que não consegue trabalho nos Estados Unidos. Para evitar que da ilegalidade partam para a criminalidade, temos que criar condições para que esse movimento migratório funcione bem para todas a partes.

A migração interna e a desiguldade social

Um grande desafio que nossos últimos presidentes finalmente tiveram coragem para enfrentar é a grande desiguldade social de nosso país. Vamos lembrar um pouco o que diz o Art. 3º da nossa Constituição Federal:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
  1. construir uma sociedade livre, justa e solidária;
  2. garantir o desenvolvimento nacional;
  3. erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
  4. promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Mas não dá para acabar com essa desiguldade de uma hora para outra e ainda falta muito para aumentar as oportunidades em regiões mais pobres (falta investir na educação básica, por exemplo). Enquanto isso, os brasileiros das regiões mais prósperas têm que aprender a aceitar os migrantes de outras regiões que vêm em busca de trabalho. E não adianta usar o argumento "estão roubando nossos empregos", todos sabemos que os migrantes geralmente ocupam as vagas que:

  • os nativos da cidade não querem, porque estão qualificados demais ou porque podem ganhar o mesmo fazendo algo menos sofrido e suado. Isso acontece bastante nos seringais, canaviais e nas usinas de álcool em Goianésia (GO), cidade onde nasci. A maioria dos trabalhadores braçais que movimentam a agroindústria do município são do norte goiano e das regiões Norte e Nordeste do Brasil;
  • os nativos não podem preencher. Aqui em Goiás, isso acontece bastante em Goianésia, Anápolis, Catalão e Rio Verde, onde vários postos de trabalho pedem qualificação que não é oferecida aqui no Estado.

Mas a cada ano mais investimentos surgem em regiões antes esquecidas do Brasil, de forma que a migração interna causada pelas desiguldades sociais tem sido cada vez menor e em várias regiões ocorreu até inversão no sentido migratório. Você já conhece Matopiba?

Os concursos públicos: migração interna com estabilidade

Quem conhece o "mundinho paralelo" dos concursos públicos sabe que eles são uma das principais e mais seguras formas de migração interna do Brasil.

Na autarquia onde trabalho atualmente, por exemplo, passaram no concurso jornalistas baianos, capixabas, cearenses, paulistas, cariocas, mineiros, sem falar dos muitos que vieram do Distrito Federal e do interior do Estado.

Mesmo que ainda restrita a poucos - já que viajar para fazer uma prova em outro Estado exige um investimento considerável - é preciso reconhecer que o concurso público é uma forma de migração meritocrática e estável, já que o migrante tem trabalho garantido pelos próximos anos (e só vai sair se quiser), plano de saúde, dinheiro para se alimentar, dinheiro para pagar moradia, dinheiro para o lazer, círculo social para se integrar à cidade, etc.

E mesmo tendo o concursado condições de viver bem, sem "incomodar" a prefeitura nem os demais moradores da cidade, ainda há quem seja contra concursos públicos abertos a pessoas de todo o Brasil. Quando entrei na Agecom tinha muita gente conservadora reclamando que não era justo as vagas dos goianos serem "dadas" a jornalistas de outros Estados. Aff!

Eu sou a prova de que vários goianos conseguiram vaga, tanto que a maioria dos aprovados era daqui de Goiânia mesmo. Mas o reaça não se importa com estatística. Ele acha difícil ter que conviver com um colega que tem sotaque carioca ou baiano, que usa gírias e expressões que ele não entende nem está disposto a entender, então começa a fazer drama. Eu mexi no seu queijo!

O Enem, as universidades públicas e a migração interna

As universidades, principalmente as públicas, sempre foram redutos de migrantes, tanto no corpo discente quanto no docente. No meu curso não era muito comum, me lembro apenas de alguns brasilienses e cabo-verdianos, mas quando entrei no coral e também no grupo de católicos da universidade, percebi que o número de migrantes de várias regiões do Brasil era significativo em outros cursos.

E se antes essa forma de migração estava restrita aos jovens de classe média alta que tinham condições de prestar vestibular em vários Estados, agora vai ser uma oportunidade também para os jovens mais pobres: o estudante se inscreve no Exame Nacional do Ensino Médio pela internet, faz a prova na própria cidade e depois pode ser inscrever em várias universidades do Brasil que adotam o Enem como forma de ingresso. Uma vez aprovado em alguma delas, fica bem mais fácil para o jovem calouro conseguir ajuda, vaquinha, doação para a viagem de mudança.

"Moral" da história

Quem é contra a imigração ou a migração interna tem que se preparar porque nordestinos, africanos, concursandos e calouros vão mexer ainda mais no seu queijo e se tudo der certo chegaremos a um ponto onde será impossível impedir que o queijo de alguém seja mexido.

Sou a favor de que o Brasil continue colorido, cheio de etnias, misturas, sotaques, aculturações, miscigenações, rituais e que acolhe com carinho as pessoas que estão aqui em busca de estudo, de trabalho, de felicidade, de um sonho.

Até mais!

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